Uma noite de garoa frigída pairava sobre as terras paulistanas, lembrando de tempos que o clima não era impecílio para sair e desfrutar da noite alternativa. Foi um momento especial, já que me somava a uma legião que aguardava ansiosamente a apresentação do duo mexicano Hocico, aqui no Brasil. Para esse humilde apreciador e fã da banda, prestigiar um show do Hocico em território brasileiro soou quase como um sonho realizado, visto que, por várias vezes e muitas trocas de emails, o sonho de ver algo acontecer no país era quase impossível.
Problemas anteriores com outros organizadores latinos, cachês altíssimos, compromisso com gravadoras associado ao grande sucesso da banda, incompatibilidade de conexão entre o Brasil e a Europa foram alguns motivos que me fizeram acreditar que uma turnê latino americana do Hocico não aconteceria por aqui. Mas aconteceu, e a banda confirmou presença...
As redes sociais demonstravam que a maior preocupação dos fãs brasileiros foram sobre a idoneidade da produtora que anunciou a turnê do Hocico e as condições de infraestrutura do local que abrigaria o evento. Desde sua localização até a qualidade de som e luz. Afinal, a espera de quase 10 anos deveria ser honrada com todas as condições necessárias para que o Hocico pudesse realizar um show histórico.
A Dark Dimension foi a produtora que apostou na turnê do Hocico e investiu para que os brasileiros pudessem prestigiar a banda. A Dark Dimension é uma produtora de eventos que atua em São Paulo e desde sua criação (2002) tem o propósito de impulsionar o cenário alternativo brasileiro, concentrando - se principalmente em bandas de Metal e suas inúmeras variações. Bandas como Deathstars, The 69 Eyes e Cradle of Filth estão em seu line up e apesar do pouco tempo na ativa, a produtora paulista já contabiliza mais de 250 eventos realizados.
O Hocico foi a primeira banda no estilo "Electro Dark" trabalhada pela produtora e a casa escolhida para abrigar evento tão esperado pelos brasileiros foi a BlackMore. No início da divulgação do show do Hocico no Brasil, a casa que abrigaria o evento foi a Tribehouse, porém, por motivos ainda obscuros, a BlackMore foi confirmada. Confesso que mesmo assitindo o vídeo lançado no Youtube pelo vocalista da banda Erk Aicrag não me senti seguro em ir ao show exatamente pelo fato de achar que o BlackMore não poderia suportar um show de uma banda como o Hocico, principalmente por se tratar de uma banda "eletrônica" tocando em uma casa acostumada com bandas "acústicas". Deixei para comprar meu ingresso no último dia, ainda não acreditando no que a noite de domingo poderia me reservar. E tive algumas surpresas...
O BlackMore é uma casa de shows muito bem localizada, em uma das alamedas mais caras de São Paulo. Apesar disso, é uma casa simples, com bebida relativamente barata e adequada a lotação máxima de 400 pessoas. Pela pouca movimentação dos fãs na porta, pude imaginar que o show não passaria de 200 pessoas. Não sei ao certo quantas pessoas apareceram no show, mas a casa abrigou bem a todos os presentes.
O Show começa com a entrada de Racso Agroyam (Programador Musical), devidamente posicionado abaixo de um telão que passava imagens que fariam parte do show, seguido de Erk Aicrag (Vocalista), agitando o público que se amontoava próximo ao palco. Na hora esqueci todas as preocupações e passei de crítico a fã incondicional, cantando as músicas junto com a banda. Infelizmente as minhas preocupações começaram a tomar forma - os problemas técnicos começaram e se refletiu na performance e no entusiasmo mostrado pela banda no começo do show. Houveram algumas paradas para tentarem acertar os problemas. Pelas inúmeras tentativas de ajustar o som e se desdobrarem a fazer o melhor possível, o Hocico já fez valer o ingresso.
Era nítida a vontade da banda em tocar. A espera de 10 anos não foi somente dos fãs brasileiros, mas também da dupla mexicana, que nunca escondeu sua vontade de tocar aqui. Na sua última tentativa, Erk Aicrag fecha o show com a música ECOS, deixando o palco decepcionado junto ao Racso, que se junta ao público próximo ao palco para um "adeus" (ou um até breve...)!
Tive a oportunidade de conversar com o técnico de som do Hocico (que por sinal foi muito atencioso com os fãs) para que pudesse autografar meus discos e cds. Acabei sendo conduzido por ele até a dupla mexicana, para que pudesse também, trocar algumas idéias. A primeira impressão foi que estava ali, conversando com duas pessoas humildes e profissionais, que inicialmente mostraram preocupação com a casa de shows no Rio de Janeiro após os problemas ocorridos no show em São Paulo. Iniciamos uma conversa que se alongou naturalmente. Procurei incentivá - los, falando brevemente das particularidades da cidade maravilhosa. A conversa acabou transformando em uma breve entrevista que divido aqui com os caros leitores:
R.Nacht - O Hocico é conhecido e reconhecido no mundo todo. Seu sucesso no Brasil cresceu assim como seu sucesso em outros países. Qual foi a sensação de confirmar o show da banda em território Brasileiro?
Erk Aicrag - Obrigado por vir ao show. O Hocico é uma banda latina e vemos os brasileiros como irmãos. Quando confirmamos o show no Brasil foi uma grande alegria. Há 10 anos estamos esperando por isso, e dessa vez conseguimos vir. Temos muitos amigos aqui e sabemos que o público brasileiro aguardava nosso show. Ficamos honrados com o convite e aqui estamos.
R.Nacht - Ficou evidente que a banda perdeu o entusiasmo devido aos problemas técnicos e isso é totalmente compreensivo. O que vocês poderiam falar sobre isso?
Erk Aicrag - É uma pena que os problemas técnicos atrapalharam o show. Gostaríamos de cantar várias músicas mas fomos impossibilitados. É uma pena. Imaginamos que nosso show traria mais público. Estamos acostumados a tocar em grandes eventos e por acreditarmos que o Hocico era tão aguardado pelo fãs brasileiros, achamos que viriam mais pessoas. Independente disso fizemos muitos amigos no Brasil e esperamos uma nova oportunidade para voltar, se assim quiserem.
R. Nacht - Se depender do público brasileiro, o Hocico virá sempre. Sei que a gravadora e os compromissos junto ao Rabia Sorda em um show na Alemanha o fizeram chegar em cima da hora para poderem cuidar dos preparativos para o show. Evidentemente que você já está acostumado com essa rotina. Você atribui a falta de tempo como um fator que contribuiu para os problemas técnicos ocorrerem?
Erk Aicrag - Como você mesmo disse, já estou acostumado com esse tipo de coisa. Viajar faz parte da nossa rotina e trabalhamos muito. Viajar na Europa é mais fácil e o profissionalismo é grande. Já tivemos problemas técnicos parecidos em vários locais, porém é desagradável quando eles acontecem independente do lugar. Fiquei decepcionado de ver os problemas acontecendo aqui. É a primeira vez que tocamos no Brasil e não poderíamos errar. Talvez com mais tempo poderíamos amenizar os problemas, mas não acho que isso foi o fator determinante.
R.Nacht - Uma última pergunta: Os fãs brasileiros poderão aguardar um novo show no Brasil?
Erk Aicrag - Faremos um show no Rio de Janeiro amanhã e esperamos que tudo dê certo. Gostaríamos muito de tocar no Brasil mais uma vez. Torcemos para que isso aconteça em breve e que os fãs brasileiros não esperem mais 10 anos para que isso aconteça.
Ali nos despedimos e dali sai com a certeza de que o saldo final foi extremamente positivo.
Independente dos problemas ocorridos durante o show, gostaria de parabenizar a Dark Dimension pela iniciativa de trazer o Hocico ao Brasil. Agradeço também ao amigo e ativista Wandeclayt que cedeu espaço no Overclock Zine para essas meras impressões.
Rodrigo Nacht
PÓS - SP